A nova moda do pessimismo nacional
Quem controla a narrativa do declínio?
A questão raramente discutida é esta: quem ganha com a ideia de que o país está irremediavelmente perdido?
Grande parte da produção desse discurso parte das elites antigas e novas que historicamente moldam as percepções sociais. São esses grupos que determinam o que é visto como falha moral, como progresso ou como atraso. A narrativa do declínio funciona como uma espécie de marketing político e social, onde o país é um produto em deterioração e os narradores se apresentam como observadores inocentes do desastre. Até como revoltados e não como vencedores de toda essa desorganização.
O privilégio que se reconhece… e que se reproduz
Enquanto isso, criticam o “povo” a partir de restaurantes caros, atribuindo comportamentos de sobrevivência à “mentalidade”. O que falta dizer é que a pobreza não é um traço cultural, mas uma condição material. Uns até gritam que precisamos disciplinar os pobres, claro, o bom uso da vara, como dizia Salomão em Provérbios.
A nova elite da era digital
Curiosamente, é também esta elite que mais repete a ideia do “declínio nacional”. Mas raramente menciona que ela própria molda, direta ou indiretamente, o destino económico e simbólico do país.
Uma disputa antiga: elites e política
Com isso, difundiu-se a ideia de que “tudo depende da mentalidade”. Como se um país insular, de economia reduzida, pudesse ultrapassar limitações estruturais apenas com força de vontade.
O mito neoliberal da ascensão individual
O resultado é um discurso moralizante que responsabiliza os vulneráveis pelos limites que não criaram.
Por sussurro quase cristão, ouço uma voz:
“Pobres, levantem e enriqueçam! Empreendam! Não sejam preguiçosos… é apenas isso que vos separa de Elon Musk ou Jeff Bezos.”A verdadeira tese: o problema não é o país — é quem narra o país
Para além do barulho, é preciso esclarecer:
o problema não é que São Tomé e Príncipe “vai mal”; o problema é quem diz que vai mal, e porque esse discurso lhes serve.
A narrativa do declínio cumpre várias funções:
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Oculta responsabilidades de elites que sempre controlaram oportunidades;
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Legitima privilégios antigos e novos;
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Desvia o debate das condições estruturais para a suposta falha moral dos pobres;
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E reforça uma visão neoliberal onde problemas sociais são tratados como defeitos individuais.
Enquanto continuarmos a aceitar essa narrativa sem questionar os seus autores, confundiremos crítica com fatalismo e diagnóstico com propaganda.
Conclusão: menos profetas da decadência, mais responsabilidade real
certa vez vi como Thomas Sowell alertava que muitos intelectuais não enfrentam responsabilização real pelas consequências de suas ideias, eles podem estar errados, inovar ideias perigosas, mas raramente pagam o preço prático por isso.
Se quisermos avançar, é preciso substituir o fatalismo performativo por responsabilidade concreta. Menos discursos sobre a decadência nacional e mais compromisso com a verdade, com o contexto e com a urgência de transformar aquilo que durante décadas foi apenas comentado.
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