terça-feira, 22 de agosto de 2023

A servidão voluntária & Desobediência Civil. Dois livros, duas faces de uma mesma moeda.

Sempre que imaginamos o autoritarismo é com um olhar de 1984 de George Orwell. Um Big Brother que tudo vê e tudo esmaga tomando para si o monopólio da verdade descrito por Achille Mbembe quando fala do Estado Teológico ou quando vai um pouco mais longe falando sobre a necropolítica.

Escrevo para uma amiga, talvez o texto possa parecer pretensioso, mas ela enquanto jurista deverá ter uma veia , id est, npara abstrações, não me levem a mal se parecer assaz verborrágico.

La Boétie sempre pensou na estrutura do poder não no sentido de Max Weber, mas, em como as pessoas abandonavam a sua capacidade crítica e oferecia à estrutura toda a sua liberdade. Ele descobriu que era cômodo deixar que os seus problemas fossem resolvidos por alguém que pretendia os resolver, logo, não havia tantas vítimas, mas muitos cúmplices...

Na mesma senda, Henry Thoreau percebeu que a chave na luta contra a tirania norte-americana do estado consistia na desobediência civil, em não cooperar com o estado. Claro, ele acabou preso, contudo, inspirou dois personagens icónicos: Martin Luther King & Mahatma Gandhi. Dois pacifistas que escolheram a desobediência civil  enquanto método de resistência.

Portanto, quero dizer-te, querida amiga, as instituições são kafkianas, enormes, monstros colossais com enormes “processos” que parecem ilõgicos. Sempre que refletires sobre o “status quo”, é sempre bom olhar em volta todos que se beneficiam com o “status quo”, os famosos reacionários.

Quero terminar com a explicação de Malcolm X quando falava das revoluções possíveis ao sistema. Ele dizia que a revolução jamais acontecerá quando o crítico do sistema apenas está pedindo ao sistema que o incorpore. Talvez Paulo Freire estivesse certo, “quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é virar opressor”.

Quero deixar uma esperança para ti. Mas fica para um outro momento, agora podemos só refletir sobre a liquidez do mundo, das crises na Argentina, toda a região de Sael, o que anda fazendo o CEDEAO e de que material orgânico é feito o Nobel da Paz do atual presidente da Etiópia… temos muito do que falar sobre a geopolítica do “terceiro mundo”.

Abraços

 

 

 

 

terça-feira, 15 de agosto de 2023

“Família Forte” descobriu a fórmula de sucesso! Música em tempos líquidos!

Faz uns dias que ouço uma música que na minha mente fosse resultado de algum Dj engenhoso reunindo clássicos da música santomense com um arranjo instrumental mais ousado para atingir a juventude.

Todavia, quero dizer que essa fórmula já foi criada em escala menor tempos atrás, contudo, só agora esses meninos da Família Forte escalaram a fórmula trazendo um elemento que não tinha sido muito bem explorado pelos seus antecessores: “os vibrados”, o pessoal do Rap/Stléva, e mais alguns que por motivos de memória não consigo me lembrar.

Qual é a fórmula? -  Consiste em trazer os elementos do quotidiano, clássicos da música santola (o bordão ou o refrão) e tudo isso num arranjo moderno para atingir a juventude santomense.

Os antecessores estavam mais focados em cantar a realidade do país, os vibrados estavam focados nisso, mesmo que com todos os seus vieses que decorrem da perspetiva cultural, mesmo assim, ainda havia um elemento que falta na nova fórmula – a inovação lírica. Os versos do Rei Kongo em crioulo forro causam riso, espanto, é liricamente interessante… o mesmo vejo no AG Flyzer e outros que por mais uma vez esqueço de mencionar por não ser um profissional. Saudades do Mano Jacaré e das rimas em crioulo de G da Wella que pararam a Biblioteca Nacional.

Por outro lado, Família Forte faz-nos viajar no estilo de Sum Cornélio, PP Lima, rimas de Mito & Gi. Eles repetem as mesmas rimas… e isso explora o saudosismo em nós. Ao ouvir julguei estar ouvindo Babylónia no seu reggae santola. Ao ouvir esses miúdos consigo sentir vários cantores que eles juntam numa amálgama musical qualquer. Não sei se é essa a proposta, mas é isso que estão fazendo. Juntaram partes de cada gigante da música santomense que a nova geração talvez ignore. O arranjo musical moderno e mais tecnológico com um bass mais mastigável acaba por atrair jovens e a velha geração entende as referências e têm um momento saudosista.

Por fim, o monstro de Frankenstein criado pela Família Forte consegue agradar aos gregos e aos troianos e enaltece o nosso crioulo forro em algum nível. O que a Família Forte faz eu comparo com o que o filme “Black Panther” fez para o movimento negro. Um conjunto de pessoas que não conhece Fanon, Aimé Césaire ou o Black Panther Party (ironia) é capaz de dizer Wakanda Forever. Um conjunto de jovens que não entende a originalidade de África Negra, as pérolas de Aidé Índia ou Os Úntués ou a nova geração que nem ouve Camilo Domingos estará repetindo “está tomare kumba, está tomare só” como se estivesse diante de uma grande descoberta… ---- 

Não posso deixar de agradecer à Família Forte e aos outros por fazerem os jovens se interessarem pelo crioulo forro e ao Calemas que ganham mais vendendo um pouco da alta filosofia “Bamu Kélé” para quem não tem tempo de ler São Deus Lima ou aos Rapazes do Milongo para quem não tem tempo de ler Padre Sacramento Neto… Cultura é pop! Freio o meu instinto cultural conservador e todo o meu sarcasmo para genuinamente agradecer ao pessoal porque tem resultado.

 

Obrigado… deixo aqui as referências e outras sugestões para os mais curiosos. OS jovens da Família Forte estão no início, ainda vão voar mais alto… espero que prefiram arte à fama. Prefiram criatividade ao aplauso.


Família Forte

https://www.youtube.com/watch?v=TR4yP6FLlRc&ab_channel=2F..Fam%C3%ADliaForte

 

https://www.youtube.com/watch?v=hyyoYSnhyJQ&ab_channel=2F..Fam%C3%ADliaForte

 

Sum Cornélio

https://www.youtube.com/watch?v=3257mxjDrc8&ab_channel=Andr%C3%A9Tavares

 

Camilo Domingos

https://www.youtube.com/watch?v=qlsf3HjtCK8&ab_channel=CamiloDomingos-Topic

 

os leonenses (escrito pelo meu tio – RIP Nuno Mandinga)

https://www.youtube.com/watch?v=Fvr1lZ7Dxjc&ab_channel=AfricaStickMusic

 

Babylónia (reparem na voz)

https://www.youtube.com/watch?v=TnRdo4y7ppA&ab_channel=MultmakerEntertainment

 

África Negra

https://www.youtube.com/watch?v=l783Lcz7ALw&ab_channel=DinneGama

 

Pepe Lima (não vi disponível a música que queria)

https://www.youtube.com/watch?v=HCNagQztpLs&ab_channel=RSTP

 

 

Venâncio Mondlane: Entre a Pedra de Sísifo e o Sonho Moçambicano

Nada mais arrogante do que acreditar que apenas criticar o sistema nos torna imunes às consequências de enfrentar as garras de uma estrutura...