sábado, 25 de março de 2023

Porque é tão difícil amar o real?

Amor fati,ou amaor ao destino, é a fórmula de Nietszche contra todo o mundo ideal que nos contrange diariamente.

Diria Nitszche:

"O amor fati é o amor ao seu destino, mesmo que ele seja duro e implacável. Somente aceitando-o e amando-o, você pode libertar a si mesmo do sofrimento e da dor."

 

Eu sei que é mais fácil gostar do calor quando se está no frio, é mais fácil gostar do frio quando se está no calor. Com esse pensamento, caímos no platonismo perigoso: acreditar que existe um mundo ideal onde não existirá nada daquilo que nos deixa triste.

Todavia, se tens em mente o ideal de família perfeita com base em redes sociais e filmes onde pessoas felizes tomam pequeno almoço juntos e riem,casais perfeitos, o sofrimento espreita.

COmo também, as Pessoas reais são falhas, na vida nós adoecemos, pessoas passam por problemas e amigos morrem. Pessoas que amamos passam por problemas e incertezas insondáveis, tais como nós. Negar o mundo real é um passo para o escapismo alcóolico, drogas, promiscuidade e se tornar vítima de pastores maldosos.

Destarte, criamos fantasias nessa vida.Desenhamos papéis para o outro que não existem: queremos que a pessoa seja A ou B. Queremos que elas nos olhem de forma C ou D… uma tentativa de tentar aplicar as nossas fantasias às pessoas e às situacões. 

Por fim, Desilusão – o mundo mostrando para ti que não és quem pensas ser e os outros também não o são. Não és exceção à inevitabilidade da morte e dos problemas. O Universo não é mau, apenas não existe para os nossos caprichos e desejos. O mundo capota diariamente… aceite-o, aceitando as emoções superamos, negando-as,sucumbimos... 

Nietzsche segurando no martelo diria:

 

"O amor fati é a chave para a felicidade, pois é a aceitação completa e incondicional de tudo o que a vida oferece, mesmo o sofrimento e a dor."

 

"Amar a vida, mesmo em sua dor e sofrimento, é o caminho para a sabedoria e a compreensão da verdadeira natureza do mundo."

 

"O amor fati é a aceitação do presente, sem desejar que fosse diferente. É amar a vida como ela é, não como gostaríamos que fosse."

quarta-feira, 22 de março de 2023

Poesia, remédio contra a modernidade doente

 

Desde o início, a linguagem apareceu como uma necessidade de expressar uma ideia. Tentativa de comunicar-nos com os outros a partir de códigos e sinais. Contudo, o que não nos contam é o quanto a linguagem é limitada, mal sabemos o que sentimos e não conseguimos nomear as coisas que passam dentro, os nossos olhares estão sempre desatentos.

Por um lado, no baile de máscaras que é a sociedade, a única variável comum é a mentira. A maior mentira contada não é aos outros, mas a nós mesmos. A grande mentira é a propaganda vendendo um modelo de vida irreal a partir de estranhos apóstolos em vestes de “digital influencer”. Por outro lado, estamos viciados na busca por distrações, queremos evitar o que sentimos. Boa parte do problema poderá ser o trabalho que não gostas, o parente narcisista, os amigos que não abandonas e o medo de estar só.

De qualquer modo, estamos sempre convencidos de sermos melhores ou piores do que de fato somos. Sócrates martela de um lado o que ouviu do Oráculo dos Delfos: conheça-te a ti mesmo. Algo simples, mas complicado de se fazer. Muitos não resistem aos rótulos. Os pais, dão-nos um nome, no apelido, está aí sepultado toda a carga histórica e expectativas frustradas que esperam que o seu gene carregado pela criança materialize. Depois a criança se faz adolescente, agora é o pensamento do grupo, ela quer se identificar com certos grupos e isso passa a ser a sua identidade… depois adulto, o trabalho, a sua sexualidade, a conta bancária, os aplausos… tudo isso joga naquilo que ele acredita ser… o que a pessoa é de fato? Queremos a felicidade do outro ou que ela cumpra nossas expectativas?

Todavia, a poesia seria uma aposta alta! É travar a vida agitada e suas rotinas desgastantes para começar a se indagar verdadeiramente: que raio de felicidade é essa que preciso estar sempre dopado? Essas pessoas que me envolvem e todos os rituais de prova de masculinidade ou de capacidade de consumo fazem sentido para mim? O que fazer quando se sente que nenhuma tribo reflete os nossos ideais? – mentimos para nós mesmos, o problema deve estar em nós. A poesia serve para dizer que não tem valor algum estar adaptado a uma sociedade doente.

Por consequência, como muitos, fico no meio de um turbilhão de incertezas que muitos acabam aplacando com copos e corpos, consumo de pessoas e adorações de objetos ou deuses e feiticeiros… e o baile de máscaras segue, muitos passam tanto tempo com a mesma máscara que esquecem o próprio rosto. A poesia serve para dizer que a vida é um ato de ousadia, um ato de resistência, dar chance à realidade. A poesia questiona o quotidiano e quebra os pés de argila da Normalidade…

Quem são os outros que nos olham como juízes? Por qual motivo precisamos estar perdendo a nós mesmos numa tentativa de pertencer, de buscar aplausos, precisamos de fato imitar a vida artificial das redes sociais?! Por qual motivo todos os atos de amor aparecem ligados ao consumo? O presente caro que significa amor, os banquetes intermináveis como família unida, o casamento que precisa ser uma espécie de pompa para os outros… Porque o Natal tem cores da Coca-cola? Quando foi que viramos jogadores do jogo de quem importa menos com os outros? A história da civilização se encerra no sepultamento de todos que ousam revelar a Verdade – Somos reféns de imagens irreais.

Por fim, pessoas, tudo é sobre pessoas, todas tão iguais representando um papel emprestado. A sensação que sempre tive é de todos estarem em monólogos consigo mesmos, dois monólogos numa tentativa de diálogo impossível. A sensação é de as pessoas imitarem ídolos: o tipo intelectual, a pessoa de família, o arrogante disfarçando a ignorância com títulos e posições sociais, a Diva soberba, … Depois o cansaço, rejeitei todos esses títulos. Longe da perfeição, apreciava as conversas literárias mais irónicas com meu pai. Amigos e companheiros de sarcasmo em toda a parte do mundo. A poesia não tem pátria.

A poesia cai como um martelo estoico e pergunta-me: conheces o teu bisavô e a vida que teve? – Respondo que não. A poesia depois grita: memento mori! Um dia serás alguém que em duas gerações ninguém se lembrará. Não precisas das opiniões dos teus contemporâneos. A vida é o que acontece quando não és mais dominado pelo medo. Liberdade é quando não negocias mais a tua felicidade aceitando rótulos… Por ser momento poético, quero terminar com esse trecho:

 

“Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão...

Eu passarinho!”

(Mário Quintana)

 

Nota: Bem-vindo Marvin, nasceu no dia da poesia e da criação da Ilha dos Poetas vivos!  

Venâncio Mondlane: Entre a Pedra de Sísifo e o Sonho Moçambicano

Nada mais arrogante do que acreditar que apenas criticar o sistema nos torna imunes às consequências de enfrentar as garras de uma estrutura...