sábado, 8 de outubro de 2022

Os meninos da rua ou os fantasmas da capital

 


 

Ao passarmos pela capital rapidamente somos convidados a fechar os olhos para a nova barbárie que é crianças a pedir dinheiro pela capital. Em algum momento passamos a normalizar crianças que não vão mais à escola e se dedicaram full-time à mendicidade. Outras até parecem que estão vendendo alguma coisa, quando na verdade são colocadas ali como faquires indianos, elas esmolam mais do que vendem alguma coisa. normalizamos uma criança-mãe carregando uma criança-filho enquanto vende saldo.

Qual é a consequência disso?

Ao nível social, sabemos que as crianças na rua começam realmente pedindo, acabam fazendo uns pequenos furtos aqui e acolá, quando dermos por nós, as crianças recriam o caso Ventura e eliminam pessoas. O facto de gozarmos de uma suposta tranquilidade não evitará esses jovens fora de toda a manifestação de consumo de assaltarem-nos, violarem e tirarem a vida futuramente aos que passam desavisados ou incautos.

Um ambiente propício?

Temos de ter a consciência que a nossa cidade durante a noite quase não tem policiamento público e boa parte das vias estão sem iluminação pública. Logo, é sábio pensar também que a polícia não conseguirá dar resposta ao ocorrido de forma eficiente, uma vez que falta investimento na segurança. Os fantasmas estão dormindo nos bancos da praça; estão ali nos restaurantes pedindo aos turistas; estão nos bares mendigando; estão nos cafés pela manhã... só não são levados à sério... 

O que não entendemos?

As pessoas podem pensar que se trata agora de criar muros maiores, colocar mais seguranças nas ruas e ter uma polícia mais musculada.  Não é nada disso, repito, não é nada disso. Não se trata de apenas travá-los, a máquina não vai parar de criar esses fantasmas ... a pobreza alastra-se, quem não rodar bolsas na ponte, caçar dinheiro aos turistas em bares, acabará por virar um desses fantasmas

Qual é o ponto?

Se esses jovens não conseguem comer, nós não conseguiremos dormir aqui na ilha. Se esses jovens não forem apadrinhados pelo sistema educacional, eles vão colocar-nos no sistema hospitalar ou num necrotério. Se não tornarmos essas vidas mais valiosas, os que possuem alguma coisa, terão de se esconder dos que nada possuem. Trata-se de facto de ajudar esses meninos. Por mais egoísta que alguém possa ser, saiba, quando ajudamos esses jovens de uma forma estratégica, estaremos ajudando a nós mesmos. Ou teremos de eliminá-los da forma mais bárbara, pois, para quem tem nada a perder, a moral é só uma fábula bonita para os privilegiados. 


Um dia desses a minha casa foi invadida por esses meninos, levaram algumas coisas, mas estava vazia... um dia eles encontrarão alguém lá dentro, na minha casa ou na vossa... o que acham que irá acontecer?!

Venâncio Mondlane: Entre a Pedra de Sísifo e o Sonho Moçambicano

Nada mais arrogante do que acreditar que apenas criticar o sistema nos torna imunes às consequências de enfrentar as garras de uma estrutura...